Um dos principais entraves em qualquer discussão que se possa ter hoje em dia é a falta de um acordo nos princípios base sobre aquilo que vivenciamos. Estou certo que todos já vivenciamos esta sensação: seja em que assunto for - economia, política, tecnologia ou religião - inevitavelmente encontra-se uma barreira intransponível na comunicação. Por mais que se tente argumentar racionalmente sobre um certo ponto, haverá algo em nós e no outro que impossibilita um acordo. A palavra acordo já nos aponta para onde se situa essa diferença: não é algo racional, mas sim algo do coração.
Vejamos: a ideia de que a realidade obedece a princípios não é consensual. O princípio de que existe algo acima (e o porquê de esse princípio estar claramente acima) entra em claro conflicto com a modernidade. Pelo contrário, as coisas são o que são maioritariamente por acaso: por acaso aconteceu o Big Bang, e por causa disso temos um universo infinitamente vasto que obedece a certos princípios da matéria, e tal permitiu que a vida como a conhecemos se formasse; lá calhou de haver um planeta com as condições perfeitas para que ao longo de milhões de anos os acasos continuassem a suceder-se para estarmos todos aqui hoje.
No entanto, acho que é fácil perceber o quão disparatada e nociva é esta visão. Imaginemos um animal num zoo: manter um animal em cativeiro é algo extremamente difícil de aceitar; não é difícil de imaginar o quão mau será para um animal viver em condições de extrema privação de liberdade e contacto com aquilo que estará de acordo com os seus instintos (leia-se, em consonância com a sua essência). E isso também se vê na fisionomia do animal: não são raros os casos de animais disformes (palavra curiosa) que podemos visitar num zoo. Tudo isto poderá ser explicado da seguinte maneira: aquela situação, de tão artificial, torna óbvio a dissonância entre a essência e a forma. As coisas só podem ser realmente inteligíveis se forem entendidas à luz de certos princípios: há algo acima do animal de zoo em concreto (ou seja: a ideia do que é um animal) que entra em conflicto com o contexto e torna claro o porquê das coisas serem como são nos diferentes níveis (físico, psíquico, espiritual).
Enquanto continuarmos a ignorar a metafísica do mundo que nos rodeia, não nos restará muito mais do que sermos como o animal do zoo: estamos em ambientes tão separados da nossa essência que ficamos disformes. É normal a sensação de que nada podemos fazer de importante para melhorar a nossa situação, e isso não é mais do que o modo contorcido de como a intuição de que algo está mal se revela. E, de facto, nada podemos fazer enquanto não percebermos quais os princípios que regem o mundo.